Saiba o que é uma liderança humanizada e entenda a importância de tornar as relações com o time mais colaborativas
O que vem à sua mente quando o assunto é “liderança humanizada”?
Mesmo que não consiga articular um conceito pronto, é muito provável que você saiba do que se trata, uma vez que a liderança humanizada se baseia em aspectos profundamente conectados às relações humanas, como diálogo, respeito, aceitação e valorização.
Se levarmos em conta a era digital em que vivemos e a ascensão da inteligência artificial, pode parecer estranho falarmos sobre a necessidade de fazer algo de forma mais humana. Mas, acredite, é justamente nesse contexto que uma liderança humanizada se torna ainda mais necessária.
Afinal, quando muitas das atividades e processos realizados nas organizações podem ser executados por ferramentas automatizadas, é a maneira como a liderança se relaciona com o time, como ela guia, orienta e ajuda os profissionais, que faz toda a diferença.
Como aponta um participante de uma pesquisa realizada pela Harvard: “Liderar significa desaprender a gerenciar e reaprender a ser humano”.
Liderança, controle e medo – uma relação enraizada
Durante muito tempo, prevaleceu nas organizações o modelo de liderança conhecido como “comando e controle”, em que o líder centralizava todas as decisões e esperava-se que os subordinados seguissem ordens sem questionar.
“Quando falávamos em liderança, enxergávamos sob a ótica de ‘chefe’. Liderar era comandar e cobrar. Nessa abordagem de controle absoluto, a dinâmica entre liderado e líder era de poder e essencialmente marcada pelo medo”, explica Rachel Goldgrob, cofundadora da GoHuman.
Alessandra Cavalcante, também cofundadora da GoHuman, avalia que, em alguns setores, principalmente de alto risco nas operações, a cultura de comando e controle tende a ser reforçada.
“Trabalhei no setor industrial durante muitos anos. Lá, vivenciei intensamente a cultura de comando e controle. Um dos grandes desafios no trabalho com as lideranças era desenvolver uma visão mais ampliada do papel de líder neste contexto, ajudando-os a perceber que padrões rígidos até se faziam necessários em alguns aspectos (como, por exemplo, preservar a integridade física dos profissionais na operação – padrões de saúde e segurança), mas que também era preciso criar um canal de abertura para que o diálogo/comunicação fluísse de maneira natural e sem medo.”
O que mudou nos estilos de liderança nos últimos anos?
Na visão das especialistas, alguns movimentos sociais e culturais contribuíram para a mudança desse cenário e o surgimento de um novo tipo de líder, mais colaborativo e menos centralizador.
Entre esses movimentos elas destacam as demandas e expectativas das novas gerações em relação às suas carreiras.
Rachel relembra que, antes, as trajetórias profissionais pareciam ser mais moldadas por circunstâncias e menos por decisões conscientes. Além disso, prevalecia o medo de perder o emprego. Assuntos como saúde mental e bem-estar, por exemplo, eram evitados a todo o custo, especialmente por conta de um receio de se perder o emprego.
“Em contrapartida, as novas gerações de profissionais passaram a pedir demissão justamente por conta desse estilo de liderança controlador. Ainda hoje, o principal motivo pela qual as pessoas deixam as organizações é o líder”, ressalta.
Alessandra concorda que as mudanças geracionais afetaram o estilo de liderança em diferentes aspectos. Segundo ela, um exemplo dessa transformação é a jornada das empresas em direção à diversidade e inclusão.
“Há 30 anos, as discussões sobre diversidade nas organizações eram totalmente diferentes – de fato, nem existia essa nomenclatura; era necessário superar os vieses inconscientes para avançar nesse aspecto”, destaca.
A especialista relembra que as pessoas começaram a questionar e perceber que algumas coisas não estavam funcionando corretamente, mesmo para mulheres executivas – que já estavam acostumadas com certas práticas.
“Lembro-me de uma situação em 2009, visitando uma fábrica após contratar algumas trainees mulheres. Durante uma conversa, uma delas mencionou que havia um problema: não existiam banheiros femininos no ‘chão de fábrica’, obrigando-as a se deslocar até o prédio administrativo constantemente, o que as prejudicava de diversas formas. Elas não foram as primeiras mulheres daquela unidade, mas foram as primeiras a terem coragem de questionar. Esse é apenas um exemplo, mas ilustra a importância do questionamento geracional na liderança e nas relações de trabalho”, analisa.
Dados que comprovam as novas expectativas em relação às lideranças
51% dos trabalhadores atualmente empregados globalmente afirmam que estão atentos ou procurando ativamente um novo emprego. [Gartner]
63% dos profissionais escolheriam uma empresa que prioriza diversidade, equidade e inclusão (DEI) em vez de uma que não prioriza – inclusive, 74% dizem que a priorização da DEI é um fator que influenciou sua escolha de onde trabalhar. [EY]
Esse tema é mais pronunciado entre a Geração Z e os millenials, dos quais 73% e 68%, respectivamente, disseram que escolheriam uma empresa que prioriza DEI em vez de uma que não o faz – contra 53% da Geração X e 46% dos baby boomers. [EY]
Aproximadamente sete em cada 10 profissionais afirmam que gostariam que sua organização e seus gerentes fizessem mais para apoiar sua saúde mental. [Deloitte]
81% dos funcionários em todo o mundo priorizariam uma boa saúde mental em vez de um emprego bem remunerado, e 64% admitem que aceitariam uma redução de salário em troca de um emprego que apoiasse melhor seu bem-estar mental. [UKG] |
Entra em cena a liderança humanizada
“Mas, afinal, o que é a liderança humanizada?”, você pode perguntar.
Como explica Rachel Goldgrob, “de forma bem simples, liderança humanizada nada mais é do que entender que você, líder, é um ser humano, e as pessoas com as quais você trabalha também são seres humanos”.
Pode parecer algo óbvio, mas, acredite, essa é uma questão cada vez mais importante no ambiente de trabalho.
Para se ter uma ideia, em um estudo global realizado pela Gartner:
82% dos colaboradores afirmaram que é importante que a organização em que trabalham os vejam como pessoas, não apenas como funcionários.
Contudo, menos da metade (45%) acredita que a organização realmente os vê dessa forma.
E ainda, outros levantamentos apontam que 90% dos líderes de RH acreditam que, para ter sucesso no ambiente de trabalho, os líderes devem se concentrar nos aspectos humanos da liderança. No entanto, apenas 29% dos profissionais afirmam que seu líder é um líder humano.
“Antigamente, éramos compelidos a agir como bons soldados, reprimindo emoções como chorar, reclamar ou sentir raiva. Agora, ao invés de sermos apenas bons soldados, podemos ser verdadeiros seres humanos, com peculiaridades, pontos fortes, áreas a melhorar, desafios e talentos. Acredito que essa é a base para estabelecer uma conexão, algo intrínseco ao ser humano”, explica Rachel.
A executiva da GoHuman detalha ainda que essa conexão só é possível quando nos
relacionamos não apenas de forma transacional, focados somente na entrega de resultados, mas também buscamos aprender, trocar experiências e evoluir como seres humanos.
Alessandra complementa dizendo que, ao contrário do que muita gente imagina, promover uma liderança humanizada não implica em aceitar negligência. Como ela explica, um líder humanizado é muito mais efetivo justamente porque promove uma maior consciência e responsabilidade nos profissionais.
“O desafio do modelo ‘comando e controle’ é que as pessoas podem se tornar menos autorresponsáveis, sempre confiando que alguém está supervisionando. Uma liderança humanizada eleva a consciência para um nível mais alto e pode trazer resultados mais robustos”, aponta.
A importância da troca na liderança humanizada
As executivas da GoHuman destacam que no contexto social atual, em que há uma tendência cada vez maior de polarização e resistência ao que é diferente, o papel do líder humanizado se torna ainda mais relevante.
Nesse sentido, as especialistas indicam que um aspecto importante da liderança humanizada é o diálogo e a colaboração.
“Criar oportunidades para as pessoas fazerem pausas para refletir é fundamental para o crescimento. Essa prática de ouvir o outro é essencial para identificação com as histórias, pois muitas vezes nos iludimos pensando que nossos problemas são os maiores do mundo. Ao ouvir as experiências dos outros, ganhamos insights valiosos”, comenta Alessandra.
Rachel conta que nos programas de desenvolvimento de liderança humanizada realizados pela GoHuman, a criação de espaços para diálogo é uma das práticas mais efetivas e que gera mais impacto.
“O conceito de estar sozinho como líder, isolado em desafios e conquistas, está sendo superado. Compartilhar dores e desafios com pares cria uma dinâmica positiva. Embora existam culturas que desencorajam a exposição, temos nos surpreendido positivamente. O compartilhamento de sentimentos comuns gera reflexões importantes sobre o papel essencial da liderança, permite a valorização e aceitação da vulnerabilidade e favorece a criação de ambientes mais humanizados e relações mais autênticas”, detalha.
Uma nova liderança para novos tempos, mas uma ideia não tão nova assim…
Mas de onde vem essa ideia de liderança humanizada?
Como comentamos no início, esse conceito se baseia em aspectos inerentes às relações humanas.
Liderança servidora, liderança facilitadora, líder coach… Ao longo dos anos, com diferentes nomes, diversos pensadores já trabalharam essa ideia de tornar os relacionamentos mais humanizados, mais centrados no ser humano.
Na obra Eu e Tu (1923), por exemplo, Martin Buber explora as duas maneiras fundamentais pelas quais os seres humanos interagem:
A relação Eu-Tu, marcada por reciprocidade e autenticidade, onde o “Tu” é visto como um ser único e valioso em um encontro direto e significativo;
E a relação Eu-Isso, em que o “Isso” é tratado como objeto, útil para análise ou controle.
Buber enfatiza a importância da relação Eu-Tu para uma vida plena, argumentando que é por meio dessa conexão genuína que se alcança uma compreensão mais profunda da existência. Para ele, cultivar relações Eu-Tu não apenas muda a forma como nos relacionamos com os outros, mas também representa uma transformação espiritual e ética essencial.
Ou seja, podemos dizer que a ideia da relação Eu-Tu é uma base fundamental da liderança humanizada: ver o outro como um ser humano, e não apenas como um “recurso” que serve à organização.
Mais recentemente, um outro conceito baseado nessa mesma ideia foi abordado no livro Humanocracia: Criando organizações tão incríveis quanto as pessoas que as formam (2021), escrito por Gary Hamel e Michele Zanini.
Os autores defendem que as empresas podem se tornar mais eficientes, inovadoras e resilientes ao adotar a humanocracia: “a humanidade acima da burocracia”.
“Humanocracia defende que precisamos colocar os seres humanos, não estruturas e processos, no centro de nossas organizações. Ao invés de um modelo de gestão que busca maximizar controle, pensando em eficiência, precisamos de um modelo que busque maximizar a contribuição, para gerar impacto. Ou seja, precisamos substituir burocracia por humanocracia”, aponta Michele.
Os pilares da liderança humanizada
Levando em conta os diferentes pensadores e especialistas que já trabalharam essa questão e também suas experiências e conhecimentos no desenvolvimento de líderes, Rachel e Alessandra estabeleceram alguns pilares fundamentais que envolvem a liderança humanizada.
De acordo com as especialistas, a liderança humanizada está intrinsecamente conectada à promoção de segurança psicológica.
“Na liderança humanizada, a segurança psicológica emerge de forma natural, sendo fundamental para estabelecer diálogos autênticos. Um líder que reconhece a vulnerabilidade como parte integrante e concede a todos o direito de se expressar cria possibilidades valiosas”, frisa Alessandra.
Ela destaca ainda o papel crucial da liderança na construção desse ambiente psicologicamente seguro, sempre calibrando a dinâmica da equipe, o nível de respeito e os acordos estabelecidos.
“Essa abordagem é essencial para todas as áreas, desde entregas até aprendizado, permitindo que as pessoas se sintam à vontade para serem autênticas. A segurança psicológica se torna a base fundamental, construindo confiança e promovendo um ambiente propício para aprendizado mútuo e superação de desafios. Essa é a nossa abordagem”, detalha.
Por fim, as executivas da GoHuman indicam que a construção de uma cultura inclusiva e colaborativa, apoiada pela segurança psicológica e pela liderança humanizada, é sustentada por algumas práticas fundamentais:
A GoHuman promove discussões como esta em times executivos e conselhos. Gostaria de conhecer o nosso trabalho? Entre em contato e saiba como podemos ajudar.
Saiba mais sobre segurança psicológica e cultura humanizada:
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