Rachel Goldgrob, cofundadora da GoHuman, fez uma imersão na Dinamarca para entender o que torna o país escandinavo um dos mais felizes do mundo. No primeiro artigo da série sobre esse tema, ela apresenta as três dimensões da felicidade e começa a revelar o segredo dos dinamarqueses
Por Rachel Goldgrob*
O que é felicidade? Será que ser feliz depende de fatores externos ou está relacionado a um estado mental individual? Satisfação é garantia de felicidade? Ser feliz é um objetivo a ser alcançado ou algo a ser vivenciado até nos pequenos momentos do cotidiano?
Essas são algumas das (grandes) perguntas que filósofos e pesquisadores vêm fazendo há milênios para tentar entender a essência da felicidade.
Mas essas não são apenas questões que fazem parte do mundo acadêmico, todo indivíduo já se questionou sobre o que é felicidade e como alcançá-la. Afinal, assim como Aristóteles afirmou mais de dois mil anos atrás, muita gente ainda hoje acredita que felicidade é nosso principal propósito de vida.
Como estudiosa na área de bem-estar e saúde mental, entendo a profundidade e a relevância desse tema, especialmente no contexto atual, em que há um crescente adoecimento mental nas empresas e na sociedade como um todo.
Pensando nisso, embarquei recentemente em uma jornada para aprender mais sobre a tal felicidade...
Nesse momento, escrevo aqui de Copenhague, na Dinamarca, uma localização estratégica quando se trata de entender o que é felicidade. Isso porque uma combinação de fatores, práticas, hábitos e políticas de alta qualidade centradas no cidadão fazem da Dinamarca o segundo país mais feliz do mundo, segundo o World Happiness Report.
O que será que nós, como indivíduos, profissionais, empresas e sociedade como um todo, podemos aprender com os dinamarqueses em termos de felicidade?
Esse é o objetivo dessa minha imersão por aqui. Ao longo dessa vivência, vou compartilhar aprendizados e buscar mostrar como a maneira como as pessoas na Dinamarca vivem, trabalham e se relacionam influencia seus níveis de felicidade.
Para começar, vamos falar sobre como a felicidade pode ser medida…
As três dimensões da felicidade
Recentemente, conversei com Onor Hanreck Wilkinson, analista no The Happiness Research Institute, um centro de pesquisa dinamarquês sobre bem-estar, felicidade e qualidade de vida. Meu objetivo era entender de que maneira eles estudam esse tema e como essa questão – que parece tão subjetiva – pode ser medida na prática.
Onor explica que o instituto usa ‘felicidade’ como um termo mais abrangente, que envolve diferentes fatores. Segundo ela, de maneira geral, a mensuração desse sentimento leva em conta três dimensões:
“A primeira é sobre o que chamamos de satisfação com a vida ou avaliação da vida, e isso considera como a pessoa se sente em relação à sua vida de modo geral. Ou seja, traz uma perspectiva ampla em relação a todas as coisas que são consideradas ao se analisar como a vida está”, detalha.
Ela comenta que essa questão é medida por meio da metodologia Escada de Cantril, que tem o objetivo de capturar como a pessoa avalia sua vida partindo da seguinte pergunta:
“Se você pudesse imaginar uma escada que vai de zero a 10 – sendo zero representando a pior vida possível e 10, a melhor vida possível –, onde você se posicionaria nessa escada?”
A resposta indica como o indivíduo se sente em relação à sua vida como um todo.
A segunda dimensão de felicidade analisada tem um aspecto mais emocional, em que são mensuradas as influências positivas e negativas da vida de alguém.
“Aqui, perguntamos o quão intensamente a pessoa sentiu 10 emoções negativas e 10 emoções positivas no dia anterior. Isso nos dá uma imagem de felicidade de momento para momento, indicando como as pessoas se sentem de um dia para outro”, ressalta Onor.
Por fim, ela indica que a terceira dimensão analisada é sobre o senso de propósito. Ou seja, nesse aspecto, analisa-se quanto as pessoas sentem que as coisas que elas realizam em sua vida valem a pena.
“Essas três dimensões se unem para dar uma visão holística de 360 graus da felicidade de uma pessoa”, frisa Onor.
O que podemos aprender sobre felicidade com a Dinamarca
Sempre listada entre os países mais felizes do mundo, a Dinamarca certamente tem muito a ensinar sobre felicidade.
Segundo Onor, as análises do The Happiness Research Institute indicam que a felicidade dos dinamarqueses tem origem tanto em questões estruturais da sociedade quanto em alguns aspectos culturais. Entre eles estão:
Sistema social seguro e de qualidade
Níveis elevados de confiança
Equilíbrio entre vida pessoal e profissional
Dedicação diária para cuidar de si mesmo
Vou detalhar a seguir.
Sistema social seguro e de qualidade
Você sabia que a Dinamarca é um dos países em que se paga uma das maiores taxas de impostos no mundo?
Contudo, a maioria da população não reclama disso. Aliás, pelo contrário. Estudos indicam que cerca de 85% dos dinamarqueses estão satisfeitos em pagar impostos elevados por entenderem que, assim, estão investindo em qualidade de vida. “Em contrapartida aos impostos, eles recebem educação e serviços de saúde gratuitos e outros benefícios como licença maternidade paga e subsídios para cuidar de idosos. Então, os impostos possibilitam esse sistema de suporte”, detalha Onor.
Níveis elevados de confiança
Além disso, a analista no The Happiness Research Institute comenta que na cultura nórdica em geral, incluindo a Dinamarca, há um nível elevado de confiança – tanto interpessoal quanto institucional. Ou seja, as pessoas confiam em seus vizinhos, por exemplo, e nos políticos e governos. E isso, claro, impacta na satisfação com a vida e na felicidade.
Equilíbrio entre vida pessoal e profissional
Outro fator importante que faz com que os dinamarqueses sejam mais felizes que o resto do mundo é o alto nível de respeito em relação ao equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal. E isso, Onor frisa, é algo levado a sério pelos indivíduos e pelos empregadores.
“Ninguém espera que alguém fique trabalhando depois das 18 horas, por exemplo. Há um reconhecimento de que temos famílias, hobbies, uma vida fora do trabalho, e que isso precisa ser respeitado, que há limites”, destaca.
Dedicação diária para cuidar de si mesmo
Por fim, um aspecto cultural importante que explica a felicidade dos dinamarqueses é o fenômeno chamado hygge. Essa é uma expressão sem tradução direta, que diz respeito a uma parte fundamental da cultura da Dinamarca.
“É sobre tirar um tempo para si mesmo no dia a dia, para fazer algo que tenha um significado pessoal. Algo que traga para o indivíduo felicidade, alegria, senso de calma, serenidade ou o que quer que a pessoa busque. É sobre procurar maneiras de incorporar pequenos prazeres ao cotidiano. Ao invés de esperar por um grande momento para estar presente e curtir a si mesmo, o hygge é uma forma de cuidado pessoal mais integrada no dia a dia. Está relacionado à forma como os dinamarqueses socializam com outros, a como passam tempo consigo mesmo, com suas famílias – é algo essencial na vida diária”, esclarece Onor.
O que apresentei aqui é um resumo da conversa que tive com Onor. Convido você a conhecer melhor a visão da analista no The Happiness Research Institute assistindo à entrevista na íntegra:
No próximo artigo sobre este tema, falarei sobre os 8 fatores da felicidade dinamarquesa. Acompanhe a GoHuman no Instagram e no LinkedIn para acompanhar essas e outras reflexões.
*Rachel Goldgrob, cofundadora da GoHuman, é psicóloga com certificação internacional em Coaching de Liderança pela Georgetown University e em Estratégia de Impacto Social pela University of Pennsylvania.